Conversamos com Alessandro Andreola e Clayton Junior

Amanhã vai ter o lançamento afetivo de Música do dia na Itiban. Conversamos com o escritor do livro, Alessandro Andreola, e com o ilustrador Clayton Junior sobre a obra e, claro, música. Segue abaixo:

Alessandro Andreola

Como surgiu o Música do dia? Quando pensou em escrever o livro?
O livro nasceu de uma vontade de preservar parte do material que produzi durante os anos em que trabalhei no Power Music Club, antigo site de streaming de músicas da finada GVT. Quando o site saiu do ar, esse material foi para o limbo da internet. Mas eu sempre guardei meus textos e, desde o fim do serviço, em 2015, pensava na possibilidade de reunir alguns deles em livro. Não foi uma tarefa fácil, porque escrevi cerca de cinco mil resenhas, notícias, artigos e entrevistas para o site. Para o livro, selecionei 96 textos que foram divididos em três partes: “Playlist”, com pequenas crônicas sobre diversas canções; “Álbuns”, com análises de discos que considero fundamentais; e “Perfis”, com textos um pouco mais longos, cujo foco é em historias curiosas que envolvem artistas que admiro. Acho que o resultado final traz um apanhado bastante próximo, ainda que incompleto, do que realmente gosto de ouvir — daí o “afetivo” do subtítulo. E, de quebra, ainda faz um apanhado de coisas bacanas da música popular nos últimos 70 anos.

De que forma as ilustrações do Clayton Junior se relacionam com os textos?
Desde o início do projeto combinei com o Clayton que ele teria liberdade total para escolher quais textos gostaria de ilustrar. Isso ajudou muito a dar o tom na hora de organizar o material, inclusive na ordenação dos textos. Além de deixar o livro muito mais interessante e de apresentar uma visão gráfica e pessoal sobre essas músicas, álbuns e artistas, as ilustrações serviram também como norte para a própria tarefa de editar o material. E, claro, elas são incríveis por si só. As releituras das capas dos álbuns, por exemplo, mereciam um livro só para elas.

O que você prefere: um livro sobre canções ou uma música sobre livros? Por quê?
Acho um pouco bizarro que, seja lá por que razão, a inspiração literária para a música apareça com mais proeminência em bandas de metal ou de rock progressivo — coisas extravagantes, como “Journey To The Center Of The Earth”, do Rick Wakeman. Porque apesar de artistas como Morrissey, Nick Cave ou o Velvet Underground, por exemplo, fazerem referências literárias em suas letras, é sempre algo mais contido. Mas, no fim das contas, escolho os livros sobre música. Acho que dá para aprender mais sobre música lendo Tempestade de Ritmos ou Chega de Saudade, do Ruy Castro, ou os textos de gente como Greil Marcus, Lester Bangs, Simon Reynolds e Alex Ross, do que absorver literatura via música pop.

Poderia falar sobre sua editora Barbante? Quais os projetos futuros ?
Costumo dizer que a Barbante não é uma editora que lançou um livro, mas que foi um livro que lançou a Barbante. A editora nasceu no meio dessa vontade de se autopublicar, e, quanto mais nós (sendo “nós” eu e minha sócia, a Paola Marques) percebemos a viabilidade da coisa, fomos formatando a editora. Em pouco mais de seis meses de atividade estamos com dois livros lançados: além do Música do dia, no final de 2016 saiu Wadad, do fotógrafo Eduardo Macarios, em que ele faz um recorte da imigração libanesa no Brasil por meio de fotos do arquivo familiar e do diário da avó. É algo muito delicado e especial, com um tratamento gráfico à altura: capa dura revestida em tecido e acabamentos em baixo relevo e serigrafia. É de certa forma o que resume a proposta da Barbante: fazer livros de música, cinema, design e fotografia em tiragens limitadas e numeradas, com acabamentos diferenciados. A nossa ideia é lançar mais um título ainda neste semestre. Provavelmente será mais um volume dedicado à música.

Sugira uma música do dia para o lançamento.
Mais do que um lançamento, vai ser um encontro de velhos amigos em um lugar que frequentamos há mais de 20 anos. A Itiban faz parte da nossa formação cultural e afetiva. Por isso vai ser muito legal poder lançar esse trabalho em um espaço tão especial para mim. Então teria que ser uma música de festa. Podia ser “Loaded”, do Primal Scream. Nem que seja só por aquela introdução com o Peter Fonda falando: “We’re gonna have a good time! We’re gonna have a party!” É isso aí.

Clayton Junior

Como foi o processo de ilustrar o livro Música do dia? Você foi pautado pelo Alessandro ou teve liberdade total?
Tirando o fato que tinha de ser preto e branco, tive liberdade total. Ele me passou a lista dos músicos/músicas/álbuns e eu escolhi meus favoritos, levando em conta que ficassem bem balanceados no decorrer do livro. Depois ele me passou os textos, eu dei uma pesquisada de imagens aqui e ali e já sai riscando pra não perder tempo.

Você também é músico. Como relaciona desenho e música?
Eu não me chamaria de músico, mas gosto de tocar, tive banda, etc. Mas, pra mim, música e desenho são bichos diferentes. Eu gosto de tocar com outras pessoas, mas não me divirto muito tocando sozinho. Já desenho pra mim é uma coisa bem introspectiva, que geralmente eu faço em silêncio. Volta e meia uma ideias visuais me aparecem quando estou escutando música, ou assistindo um show. Mas quando elas chegam no papel, já estão bem diferentes.

Quando faz quadrinhos e livros ilustrados, você inclui música no processo?
Como eu disse ali, eu geralmente desenho em silêncio, mas se tem pessoas falando no ambiente e eu preciso me concentrar eu coloco fone e escuto coisas mais abstratas, na linha do Kid A do Radiohead, Yo La Tengo, Monster Rally. E em várias ocasiões eu tenho música ao vivo enquanto eu desenho. Em São Paulo, meu vizinho era trombonista de uma banda de salsa, e meu estúdio em Londres tem um estúdio de ensaio em cima e um bar de jazz literalmente na porta ao lado. Eu gosto, me lembra do meu tempo de Belas Artes quando sempre tinha alguém tocando piano, tímpano, trompete em alguma sala do prédio.

Morando em Londres há bastante tempo, como vê o mercado de quadrinhos europeu? Quais os próximos projetos?
O quadrinho europeu é muito diverso, tem um pouco de tudo em todo lugar. O Reino Unido tá finalmente despertando pra leitura graphic novel, que por mais incrível que pareça nunca foi uma cultura muito difundida por lá. Já a França é o contrário: tem uma produção enorme e é de longe o maior mercado. Quanto aos meus projetos, eu vou lançar em maio na França a minha primeira graphic novel, pela editora Sarbacane. Vai se chamar Sauvages, e é sobre um cachorro de fazenda. E em junho eu começo a publicar uma webcomic no site ErcComics (erccomics.com), que vai durar 10 meses. É um projeto de quadrinhos inspirados pelas pesquisas científicas que andam rolando União Europeia. A minha história é em colaboração com o cientista francês Mickael Tanter, que inventou uma tecnologia portátil de imagem cerebral de altíssima resolução, baseado em um ultrassom, que promete revolucionar o estudo sobre o cérebro.

Sugira uma música do dia para o lançamento.
Eu colocaria uma mixtape que o Alessandro me deu de presente de aniversário de 16 anos. Desenterrei ela dessa vez que vim pra cá e fiquei viajando. Tem desde “Summer 68”, do Pink Floyd até “I had a Dream, Joe”, do Nick Cave. Quem que com aquela idade escutava Nick Cave? Não é a toa que escreveu um livro tão bom sobre rock.

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